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Turquia: um território des-aliado?

Turquia: um território des-aliado?
abril 04
16:22 2016

“Preciosa solidão” é como por meses a mídia pró-governo tem descrito o posicionamento da Turquia no palco político global. E também como um des-aliado. Assim também descrevem muitos que estão na comitiva do Presidente Recep Tayyip Erdogan, que é aparentemente quem exerce o real poder no país, ao invés do governo do Primeiro-Ministro Ahmet Davutoglu, o órgão executivo constitucional. Pode-se dificilmente sugerir que “solidão” seja um estado reverenciado por qualquer entidade política – por isso o esforço de apresentá-la como “preciosa”. A questão é se isso significa algo além de um embuste introvertido de propaganda, unicamente destinado a ganhos políticos domésticos. A resposta é que simplesmente não o é.

Um membro da OTAN desde 1952 e uma candidata à UE em negociação por uma adesão plena há uma década, a Turquia parece ter preocupantemente se distanciado de seus tradicionais aliados – fracassando, contudo, em construir quaisquer outras alternativas significativas e viáveis para suas relações com a OTAN e a UE.

O Centro para o Progresso Americano (CAP), um think tank com importantes conexões com o Partido Democrata do Presidente dos EUA Barack Obama, publicou uma breve nota sobre as relações entre os EUA e a Turquia em 12 de março com o título “Um paço para frente, três para trás”(1) que sugeria que o histórico da liderança turca em não cooperar suficientemente com Washington em inúmeras questões de segurança assim como sua repressão contra a dissenção deveria instigar os EUA a “tentar uma nova aproximação” quanto a Ancara. A afirmação da CAP que resume isso é que “os Estados Unidos deveria deixar o AKP [o Partido da Justiça e do Desenvolvimento, da situação] usufruir de quaisquer vozes pró-governo que pediram pela ‘preciosa solidão’ do país.”

No dia seguinte, o editorial do New York Times (NYT) de 13 de março com o título “A Turquia deriva para longe da OTAN”,(2) nele a ênfase se deu em “quão preocupados os aliados estão em contarem com a Turquia em qualquer crise” recentemente. De acordo com seu time editorial, “o comprometimento do Turquia com a aliança nunca pareceu mais ambivalente do que agora”, pois o país, sob Erdogan, “não está cooperando plenamente com as prioridades e interesses da OTAN ou está atuando em total desafio a elas” em inúmeros assuntos que vão desde combater o Estado Islâmico do Iraque e da Síria (EIIS) até as relações com a Rússia e a China.

Para tornar mais grave as coisas, no mesmo dia que o NYT, o Project Syndicate apresentou um poderoso artigo sobre as ligações entre a Turquia e a UE e as recentes frustrações. Assinado pelo finlandês ganhador do Prêmio Nobel, o ex-presidente Martti Ahtisaari e o ex-primeiro-ministro francês Michel Rocard e também ex-ministros de três outros estados-membros da UE – a Itália, Espanha e Holanda – o artigo, intitulado “Um recomeço entre a UE e a Turquia”, (3) destacou um “perigoso desvio dos … valores europeus comuns”.

Para um país cujo presidente reconhece que “não se importa”(4) com o que o mundo pensa sobre a Turquia e que irritadamente rejeita críticas da UE sobre direitos e liberdades fundamentais, falando para Bruxelas “cuidar do seu próprio negócio”, (5) a Turquia recebe o que merece da mídia ocidental e da elite política. Certamente, Ancara não deveria esperar ouvir muitos elogios de Washington ou qualquer capital europeia quando está a um milímetro de comprar da China sistemas de defesa aérea e de míssil que não estão de acordo com a OTAN, fracassando em assegurar um nível convincente de segurança na fronteira para negar aos militantes extremistas um caminho livre a redutos do EIIS na Síria ou em ajudar Moscou e Teerã a driblarem as sanções ocidentais. Aliás, certamente uma repressão do governo sobre a imprensa e sobre a sociedade civil também não ajuda muito.

Portanto, não é preciso ser um gênio para observar a clara divergência política entre o ocidente e Ancara nos anos recentes. As coisas, no entanto, não parecem estar nem um pouco melhores em algum outro lugar.

Suas relações com a Irmandade Muçulmana afastaram o Egito, Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos – exceto o Catar – por mais de um ano. Ligações com Israel tem estado em uma baixa histórica por muito mais tempo. O que é pior é que sua política sobre a Síria acabou se tornando um completo fiasco, com nenhum final claro à continuada guerra civil que falhou em remover o regime Baathista, conforme Acara queria, após quatro anos de banho de sangue e uma crescente ameaça extremista militante ao sul de sua porosa fronteira de 900 quilômetros com esse vizinho irrequieto que, por sua vez, acusa a Acara de ajudar “terroristas”. (6) A Turquia nem se quer possui um embaixador no Cairo, Tel Aviv e Damasco. Bagdá e seu principal apoiador na região, Teerã, também estão com suspeitas da clara posição sectária da liderança turca no Oriente Médio (em relação ao seu envolvimento no Iraque, Síria e no Iêmen) e estão também cautelosos com o comércio petrolífero entre Ancara e Arbil, que viola a constituição iraquiana. Isso deixa a Turquia com a Rússia; contudo, desacordos na política externa entre Ancara e Moscow são grandes demais para se ignorar, particularmente quanto a Síria e o Egito. Seus posicionamentos estão divergindo ainda mais conforme o tempo passa, com Ancara nem se quer reconhecendo o Presidente sírio Bashar al-Assad e o Presidente egípcio Abdel Fattah el-Sisi como chefes de estado legítimos naquelas terras, enquanto que Moscou lidera esforços em ajudá-los a se reconectarem com o resto do mundo depois de tempos turbulentos.

O Presidente Erdogan pode manter suficiente popularidade para deixar seu círculo interno em poder na Turquia no futuro próximo, mas sob sua liderança, a Turquia provavelmente sofrerá mais ainda com o seu isolamento.

Mustafa Edib Yilmaz

(1) https://www.americanprogress.org/issues/security/report/2015/03/12/108448/the-u-s-turkey-partnership-one-step-forward-three-steps-back/
(2) http://www.nytimes.com/2015/03/14/opinion/turkeys-drift-from-nato.html?_r=0
(3) http://www.project-syndicate.org/commentary/eu-turkey-accession-talks-by-martti-ahtisaari-et-al-2015-03
(4) http://www.todayszaman.com/anasayfa_erdogan-admits-his-isolation-in-the-world-says-he-doesnt-care_372645.html
(5) http://www.rferl.org/content/turkey-arrests-eu-relations/26745526.html
(6) http://www.alarabiya.net/articles/2012/07/04/224405.html

Traduzido por: Renato José Lima Trevisan

Fonte: http://www.turkishreview.org/

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